POLÍTICAS AFIRMATIVAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO SUL E SUDESTE DO PARÁ (UNIFESSPA), E A INSERÇÃO DA MULHER INDÍGENA NO AMBIENTE ACADÊMICO

Juliana Alves de Souza.(Autora) PPGHIST - UNIFESSPA julianaalves@unifesspa.edu.be
Dra. Maria Clara S. Carneiro Sampaio(Coautorc). PPHGIST – UNIFESSA mclarasampaio@unifesspa.edu.br

Considerando a inserção da mulher indígena em ambientes acadêmicos, pretendemos por meio deste, explanar de forma resumida algumas das questões trabalhadas no projeto de pesquisa: “Mulheres indígenas e Universidade: suas perspectivas, vivências e narrativas sobre as políticas e permanência em instituição de ensino superior”, que é vinculado à linha de pesquisa: Cultura, memória e relações de poder do Programa de Pós Graduação em História(UNIFESSPA). A presente pesquisa se encontra em andamento, e diante disso o que mostraremos neste trabalho é sobretudo alguns dos resultados parciais.

O projeto de pesquisa mencionado, foi inicializado no Programa de Pós-graduação em História – PPGHIST/UNIFESSPA nos meses iniciais de 2020, por esse motivo, não poderemos expor maiores resultados, considerando o curto período da pesquisa e também o atual contexto de pandemia em que se encontra a sociedade, pois devido a isto as pesquisas sofreram também, uma desaceleração. 

As reflexões realizadas no projeto mencionado foram iniciadas, pela mestranda Juliana Alves de Souza, quando ainda cursava graduação em história 2018 - 2019, pela Unifesspa sob orientação da Profa. Dra Maria Clara Carneiro Sampaio, para fins de trabalho de Conclusão de Curso.

Assim, percebemos a importância de destacar o protagonismo de mulheres indígenas na Unifesspa, considerando suas perspectivas e vivências. Para acessarmos esses pontos realizamos entrevistas semi-estruturadas com cinco discentes indígenas da Unifesspa, conforme a tabela a seguir:

DISCENTES ENTREVISTADAS

NOME

CURSO

ETNIA

Maria Karoline Pkparti

Direito/formada

Gavião Kyikatêjê

Arai Lopes Pereira Guarany

Psicologia/2018

Guarani

Elenara Pereira Ventura Guajajara

Ciências Biológicas/2016

Guajajara

Nayanne Pereira Ventura

Direito/2015

Guajajara

Rotokwyi Airomkenti Valdenilson

Direito/2016

Gavião Akrâtikatêjê

Discentes indígenas entrevistadas. Fonte: Souza, Juliana A. Mulheres indígenas e universidade: perspectivas, vivencias e narrativas(TCC 2019.Unifesspa)

Em relação aos marcadores teóricos que conduzem os reforços da presente pesquisa, fazemos referência a pensadores e pesadoras de diferentes áreas do conhecimento que têm desenvolvido suas reflexões ligadas ao grupo que se identificam como Subaltern Studies (Estudos Subalternos). E com isso, partimos da teoria da indiana Gaytri Spivak, que fez parte dos esforços multidisciplinares que nasceram com a crítica pós-colonial(SPIVAK, 2010,p 67)

Partindo de Spivak, pensamos as experiências das discentes indígenas da Unifesspa, a partir da perspectiva da dupla subalternidade. A primeira esfera de subalternidade está ligada à pertença técnica dessas estudantes e dos silêncios históricos que ainda incorporam as populações indígenas brasileiras.

Para entendermos melhor é necessário compreendermos como estas mulheres acessam à universidade, quais políticas viabilizam esse ingresso, pois bem, sabemos que os povos indígenas por muito tempo foram entendidos como povos secundários, e passivos, isso devido à violência colonizadora, onde desde os períodos coloniais, os povos indígenas são narrados sob o olhar europeu, Maria Regina Celestino de Almeida vai nos dizer que esse caráter colonizador não ficou apenas no período colonial, pois também perpassou pelos campos historiográficos, onde as pessoas indígenas apareciam sempre em condições como se não fossem atores ou protagonistas da história. (ALMEIDA,2010)

Ela vai chamar esse processo de silenciamento, influenciou sobretudo na luta pelo s direitos destes povos, que já reivindicavam o direito por terras, direito ao acesso ao ensino básico e posteriormente o direito ao ensino superior, pois enquanto eram silenciados pela historiografia brasileira, eles estavam ativos e protagonizando suas lutas, mesmo que estas não fossem consideradas pela história nacional. (CUNHA, 1992, p. 22

Com isso, destacamos alguns marcos, como por exemplo a constituição de 1988, que inicia o debate sobre o direito e acesso à educação básica diferenciada, ou seja, a garantia de uma educação que considere suas especificidades culturais e linguísticas. O protagonismo indígena e sua importância para a história resultaram posteriormente na de cotas (Lei n° 12.711/2012), que exige das instituições federais de ensino superior a garantia de vagas para os grupos autodeclarados pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência. (PLANALTO, 2012).

É interessante pensarmos que essas conquistas são resultantes da luta destes povos que reivindicam seus direitos para com as políticas deste país. Diante disso, a Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará, desde o seu desmembramento com a Universidade Federal do Pará, (PLANALTO 2013) vem realizando um processo de seleção especial - PSE para os grupos mencionados acima, como forma de garantir a afirmação desses grupos.

É nessa trajetória que os povos indígenas começam a adentrar a universidade, e com isso, destacamos nessa pesquisa vivencias e perspectivas de mulheres indígenas, que enfrentam sobretudo essa dupla subalternidade (SPIVAK, 2010,p 67). E nessa perspectiva, consideramos importante pensar se essas políticas e o meio universitário tem permitido essas vozes, ou seja, se a mulher indígena consegue nesse ambiente aparato para que sua voz seja ouvida. E por isso é necessário percebermos quais espaços, elas ocupam dentro da universidade, ou seja, quais cursos e quais relações estabelecem. Desta forma o gráfico a seguir expressa um pouco dessa participação indígena feminina, onde essas estudantes estão alocadas nos diferentes cursos, tendo maior envolvimento nos cursos ligados à área do ensino, Direito e questões do campo.



GRÁFICO – Dados fornecidos pela DPROJ- Gráfico organizado por Juliana Alves de Souza

Assim, segundo Joan Scott, devemos repensar os lugares que as mulheres ocupam na sociedade atual, e diante disso, vizualizar os cursos que as discentes indígnas optam na Unifesspa é importante para compreendermos um pouco de quais relações estão estabelecendo no ambiente acadêmico, e quais perspectivas estão construíndo, sendo protagonistas deste espaço e fortalecendo assim a luta por multiplos direitos que transpassam suas pertenças e seus lugares de fala.

Como esta pesquisa se encontra em andamento pretendemos por meio dela, acessarmos mais elementos que dizem respeito à vivencia de mulheres indígenas na universidade para mmelhor compreendermos as diferentes relações e representações que estas desenvolvem no ambiente acadêmico, e valorizar desta forma seus protagonismos .

REFERENCIAS
ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Os índios na história do Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2010

ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Os índios na História do Brasil no século XIX: da invisibilidade ao protagonismo. Revista História Hoje. v. 1, no 2, p. 21-39 – 2012.Disponível em :< https://rhhj.anpuh.org/RHHJ/article/view/39 >. Acesso em 13 de julho de 2018.

BRASIL. Lei n. 12.711, de 29 de agosto de 2012. Dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12711.htm>. Acesso em: 21 de outubro de 2018
BRASIL. Lei n. 12.824, de 5 de junho de 2013. Dispõe sobre a criação da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará - UNIFESSPA, por desmembramento da Universidade Federal do Pará - UFPA, e dá outras providências. Disponível em : <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato20112014/2013/Lei/L12824.htm>Acesso em: 21 de outubro de 2018

CUNHA, Manuela Carneiro da. (Org.). História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.

SCOTT, Joan. “História das Mulheres. In. BURKER, Peter. A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo: UNESP, 1992.

SOUZA, Juliana Alves de. Mulheres indígenas e universidade: Perspectivas, Vivencias e narrativas. Monografia (Licenciatura em história) Faculdade de História , Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará. Marabá, 2019

SOUZA, Juliana Alves de. Mulheres indígenas e universidade, suas perspectivas, vivências e narrativas sobre as políticas e permanência em instituição de ensino superior. Projeto de Pesquisa, Programa de Pós-Graduação em históra, Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará. Marabá, 2020.

SPIVAK, Gayatri Chakravorty. Pode o subalterno falar? 1. ed. Trad. Sandra Regina Goulart Almeida; Marcos Pereira Feitosa; André Pereira. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2010.

Comentários

  1. Bom dia!!
    Achei que seu trabalho tem uma importância muito significativa para o âmbito das instituições de ensino superior. Nesse sentido, gostaria de saber quais fontes será utilizada para o desenvolvimento da pesquisa?
    Alan Martins

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  2. As mulheres, em especial, mulheres indígenas ocupam cada vez mais espaços na sociedade graças às suas lutas e rompimentos de barreiras. Inclusive no espaço político. Entretanto, ainda assim a sociedade nutre um discurso que coloca esses sujeitos em uma posição inferior e atrelados ao passado. O texto acima e seus respectivos dados demonstram que essa percepção é ultrapassada, visto que, indígenas estão cada vez mais se inserindo dentro dos espaços, e um deles é a universidade. Em análise aos dados da pesquisa, o que esses indígenas dizem a respeito do racismo e preconceito na sociedade e até mesmo dentro da universidade (que embora seja uma universidade, o estranhamento à presença indígena é perceptível)?

    Marta Lima Alves

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    Respostas
    1. Olá Marta, muito importante o seu apontamento.
      Olha, com base nas entrevistas já realizadas que infelizmente não couberam no texto publicado, posso resumir que com base na fala das estudantes indígenas existem sim algumas barreiras, que estão ligadas o contexto histórico do nosso país, que inviabilizou a pessoa indígena da historiografia(ALMEIDA,1992) e isso se reflete em diferentes espaços, como na Universidade, onde muitas vezes eles acabam sendo vistos sob olhares ainda "coloniais" . Então das meninas entrevistadas é notável um esforço para a imposição de seus protagonismos,ou seja, elas demonstram que estão se articulando na universidade procurando mostrar quem elas são para quebrar paradigmas.

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  3. Olá Alan, obrigada por sua participação aqui no meu texto. Olha estou utilizando entrevistas orais que foram realizadas com as discentes indígenas; Leis de cotas, Políticas públicas e afirmativas da Unifesspa; além de dados referentes ao quantitativo de estudantes indígenas da UNIFESSPA, esses dados foram fornecidos pela Dproj.
    ( obs: esse texto é referente à uma pesauisa em andamento)

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  4. Olá, Juliana. Primeiramente, parabéns pela pesquisa. Creio que trabalhos desse cunho são importantes, sobretudo, para refletirmos sobre os povos indígenas e a sua relação com a universidade.
    Uma questão interessante que você aponta é a significativa procura das discentes indígenas em cursos da área da educação e ensino. Nesse sentido, quais seriam as motivações que levam tais discentes a se inserirem nesses cursos? Do mesmo modo, o que justifica a baixa procura dessas discentes por cursos das áreas de exatas? São algumas questões que penso que, em certa medida, podem ter suas respostas tecidas por meio do seu trabalho.

    Jhemerson da Silva e Neto

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  5. Olá, Juliana. Sua pesquisa é extremamente essencial para nossa comunidade acadêmica.
    Gostaria de saber quais outros métodos você utilizará para compor a sua pesquisa e quantas novas entrevistas deverão ser feitas para um levantamento ainda maior desse quadro que você nos apresentou?

    Lizandra Júlia Silva Cruz

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  6. Olá Jhemerson, obrigada por sua participação aqui em meu texto.
    Como você pôde perceber no gráfico exposto, existe realmente uma maior procura por cursos da área de ensino, com base nas entrevistas realizadas, as principais motivações dessas estudantes foram sobretudo procurar cursos que lhe permitissem um maior domínio da língua portuguesa,sem se limitar apenas ao curso de Letras. Outro ponto também perceptível nas entrevistas é que essas estudantes percebem que adentrando em áreas que trabalham com a educação elas podem acessar inúmeras espaços antes negado à elas( aqui me refiro à dupla subalternidade) com base em Gayatri Spivack (2010). Perpassando a questão de gênero, é importante notar que essas estudantes ao ingressarem na área de ensino têm a oportunidade de articular novos elementos e perspectivas, nesse ponto me refiro à crítica à modelos educacionais de origem eurocentrista e masculino. Joan Scott(1992)

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  7. Parabéns Juliana pelas explanações.
    É relevante discutir as narrativas, estratégias de lutas e realidades que termos com as mulheres indígenas, sobretudo quando inseridas nas Universidades. Observa-se que mulheres indígenas, como coloca Dutra e Mayorga (2019) estão em processos de desigualdade relacionadas ao menor prestígio, a violência conjugal, a restrição das mulheres ao âmbito doméstico esvaziado de seu poder político, às violências que sofrem diante da sociedade não indígena, a invisibilização de suas pautas específicas e de seus movimentos de resistência, entre outros. Mesmo diante de tantas barreiras e invisibilidade, são mulheres que lutam e resistem, e o resultado dessas lutas é a inserção no ensino superior. Nesse sentido, essa inclusão nas Universidades federais fortalece as lutas e resistências.

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  8. Olá Juliana;
    muito interessante sua pesquisa, primeiro por tratar da questão indígena, além, por tratar da questão feminista e ainda mais além, por adentrar um universo pouquíssimo explorado que é a educação superior feminina indígena.
    Olhando, como estamos aprendendo a ver por outra ótica, no caso auxiliado por Spivak, esse mundo classificado pela autora como subalterno, nos permite trabalhar em nossas mentes, um ponto de vista que talvez, outrora não nos fosse claro, o ponto de vista que traz à discussão, maneiras de enxergarmos como esses atores, sofreram durante tanto tempo com um apagamento compulsório.
    Uma luz que se nos apresenta, exatamente essa visão dos personagens que por muito tiveram suas vozes caladas, suas existências apagadas e suas liberdades tolhidas. Parabéns.

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  9. Juliana, parabéns pela pesquisa e pelo olhar atento a uma questão tão sensível.
    Em relação a sua pesquisa e texto tenho as seguintes perguntas:
    a) O gráfico apresentado no texto faz referencia a todos os campos da Unifesspa?
    b) Quantas mulheres indígenas serão entrevistadas no decorrer da pesquisa?
    c) Quais serão os critérios de escolha das entrevistadas: por curso, por área de conhecimento? d) Por fim como avalia os impactos da pandemia para a realização de entrevistas orais? Atenciosamente (Luis Lima de Sousa)

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  10. Juliana, sua pesquisa é muito interessante e necessária. Parabéns!
    Não sei se você já teve contato com o caso de uma estudante indígena de saúde coletiva que foi jubilada, creio ser um aspecto interessante para se discutir uma dimensão das políticas afirmativas que as vezes não se debate tanto, que é a questão do "sucesso" dessas sujeitas que acessam o ensino superior através das políticas afirmativas. Além disso gostaria de saber se você já teve contato com a narrativa dessas mulheres acerca dos principais desafios encontrados e das estratégias que elas constroem para superar.
    Mais uma vez, parabéns pela excelente pesquisa.
    Carla Silveira Moraes

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  11. Juliana, parabéns pela pesquisa! Observando o gráfico do texto, onde "expressa a participação indígena feminina nos diferentes curso" recordei de uma palestra com a Cacique Katia Silene Akratikatêjê em um evento na Unifesspa (curso de extensão), em que ela falava da importância dos jovens de sua comunidade/aldeia estarem na universidade. Falou também da atenção da comunidade/liderança quanto as escolhas do curso, observando a necessidade da comunidade. Em relação as discentes indígenas de sua pesquisa há essa preocupação/reflexão no processo de escolha de seus cursos/formação? Você observou essa questão em sua pesquisa?

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  12. Juliana, gosto muito da sua pesquisa, principalmente porque você traz a tona um assunto tão próximo da nossa realidade, afinal sua pesquisa concentra-se na própria universidade. Pensando nisso, como você compreende, por meio das suas fontes/documentos, a relação dxs indígenas com a universidade? Se a universidade oferece apoio para essxs para além do que a legislação permite? e se no interior da universidade são respeitadas a cultura dessxs? Uma última questão me surge, o quanto na sua pesquisa você compreende que a universidade se torna importante para que essas pessoas sejam ouvidas, não mais exclusivamente pela "voz" do outro, mas agora pela sua própria "voz"?

    Policleiton Rodrigues Cardoso

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